sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Dê sua aula, moço!

Frequentar a sala de aula nos concede a oportunidade angustiante de perceber a dinâmica sutil que as disputas de poder apresentam no cotidiano escolar. Disputas de poder, sim, entre professores e alunos. Não se trata de uma rígida batalha entre forças antagônicas, na medida em que os alunos não são iguais e alguns fogem aos objetivos da maioria da turma. Vejamos algumas dessas manifestações.

Inicialmente cabe dizer que estou meio afastado de leituras pedagógicas que apresentem, porventura, sistematicamente essa dinâmica de relações de poder na sala de aula, suas categorizações específicas, e, em razão disso, apresentarei aqui algo segundo o meu próprio modo de ver as coisas e atribuirei denominações também próprias para as diversas situações representativas dessas manifestações de poder. Cabe também dizer que essas disputas são norteadas por valores que subjazem a todas as atitudes demonstradas por ambos os lados. Na maioria das vezes o professor pode representar uma tentativa de promover o diálogo sadio, a aprendizagem, a formação efetiva dos alunos; da parte da maioria dos alunos, pode tratar-se de como evitar tudo isso. Não por pura oposição ao trabalho do professor ou da escola, mas por não disporem realmente de vontade de aprender, pelo menos não da maneira como eu, professor, considero significativo. Em algumas situações podem simplesmente estar protestando contra o modo de ser ou de agir da escola ou do professor, ou mesmo de tudo. De todo modo, parto aqui da premissa que afirma tratar-se realmente de aversão ao saber que a escola pretende ensinar.

Uma dessas manifestações de exercício de poder dos alunos diz respeito às circunstâncias em que fica evidente sua indiferença em relação às aulas e, que, apesar disso, o professor insiste em chamar sua atenção. Coerentes com a indiferença, preferem manter pares de diálogo em meio tom, pois acreditam que assim não atrapalham  a aula para quem está interessado. Seria uma forma tácita de demonstrarem que o melhor que podem fazer é ficarem sentados no seu lugar numa quase que silenciosa conversa com o colega do lado e que da parte do professor basta que não se importe com isso. Uma expressão típica dessa atitude dos alunos diante dos professores é: “Dê sua aula, moço, e nos deixe em paz!” Pronunciada na maioria das vezes de forma agressiva, a expressão denuncia seu caráter de resistência ao poder do professor no exercício da aula, ao mesmo tempo em que estabelece marcos para a atuação escolar indiferente. Ano passado ouvia isso quase que diariamente de uma aluna que insistia em ignorar as aulas ao preferir conversar com uma colega de turma.

Uma postura, também de caráter de resistência às aulas, ocorre da parte daqueles alunos que preferem um tipo de professor que os deixe bem à vontade, que não exija deles participações nas discussões ou que encerre mais cedo a aula. Ao tentar fomentar as discussões replicam: “Professor, tudo ficou muito claro!” Os resultados das provas seguintes demonstram que se tratava apenas de evasiva discente, exercício de poder na sala de aula em favor da indiferença estudantil.

Outras formas dessa resistência podem ainda ser percebidas: o aluno que resolve apontar o lápis quando ninguém precisa escrever, o que pega uma folha em branco e resolve fazer um desenho, o que começa a digitar freneticamente a calculadora, o que dorme, o que pede pra ir no banheiro, etc. Tudo para fugir da aula! Muitos poderão questionar se não se trata do caráter monótono das aulas, da insegurança do professor ou da incapacidade deste em chamar à atenção os alunos. Sem de todo desfazer dessa possibilidade, defendo a ideia de que se trata mesmo de um sintoma geral de um mal maior: aversão ao saber!

Começaríamos então a partir daí, caso quiséssemos resolver o problema. É preciso fomentar uma cultura de aprendizagem, de valorização do saber. Quem sabe se o exercício do poder discente não se dará em favor de objetivos mais nobres, como por exemplo, exigindo mais esforço do professor, leitura, compromisso, ensino de qualidade.

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